JESUS, O INCOMPREENDIDO.
EXISTE ALGUÉM QUE NÃO O tenha sido? É óbvio que os grandes idealistas, pensadores, líderes e artistas o sofreram da pior forma. A sua condenação (justa ou injusta) foi o caminho seguido inevitavelmente por todos eles.
NO ENTANTO, EXISTEM SEMPRE MEIOS de divulgar a outro género de ouvintes (até porque falamos de música) as palavras que os dissolvem. Palavras e não só; assim se compreende que em jeito quase de desabafo, os Jesus, The Misunderstood decidiram fazer música. E o que surge de uma situação como essas? Primeiro algum choro, a seguir conselhos, mais tarde uma história e por fim decide-se não desistir de viver, e a confiança enche os bolsos de um ego reanimado.
O EP QUE ESTREOU A discografia do projecto que uniu Luís Nunes (voz, guitarras, bateria, órgão, piano) e Pedro Sousa (baixo) (e a eles se juntaram amigos acompanhantes tal como aquele que editou o formato - com o destaque de ser o primeiro - na sua própria netlabel: Tiago Sousa), chama-se "Loving In July, Dying In August". Designa-se netlabel, e refiro-o um tanto ou quanto baseado nas palavras do último nome que apontei, como um espaço na web de apresentação e promoção de projectos musicais sem objectivos financeiros e exclusivamente culturais. Isso é tão bom e uma pena em simultâneo. Jesus, The Misunderstood não serão com certeza os donos da maior originalidade de interpretação, mas «pequenos génios da música» é capaz de ser a ideal denominação do duo (porque ainda não se ouviu mais nada nem se lançaram a grande escala). A pena encontra-se exacta e indispensavelmente aí. Todos deviam conhecer este Messias. Um Messias competente, cuja missão se cumpriu, pelo menos em pequena escala. E continua. Acalma, lava-nos com umas lágrimas perfeitas libertas por alguém que não nós e embala-nos com a sua imensa boa vontade em dizer que nem tudo está mal, que tudo se vai arranjar. Mesmo sendo o último dia na Terra.
DEIXO DE DIVAGAR E CONCENTRO-ME agora em conceitos mais técnicos. "Loving In July, Dying In August", como típico EP que se preze, possui as tradicionais quatro faixas a tentar diferenciar-se umas das outras para dar a entender 'que valem a pena'. Realmente isso não se chega a pôr em causa. O estilo predominante não o deixa de ser, existe uma enorme coerência entre os vários capítulos de um pequeno livro que não se aproxima sequer da bíblia, mas um motivo sonoro ou outro faz por marcar cada tema. A produção é e não é perfeita. É, porque regista consigo uma maneira de ser própria e caseira, mas igualmente por isso se tornar numa música cujo som pode não ser o propício q.b. para uma reprodução destinada a um grande público. E por não ter esse grande público possui aquela característica que só alguns sabem aproveitar: a de dar a oportunidade de nos esquivar-mos da sociedade e agarrar-se a nós. Entranha-se. Não vou dizer que me 'faz chorar' porque isso arrisca a tornar-se progressivamente num cliché altamente comum e quase de mau gosto. Fá-lo-á muito provavelmente, acredito, mas ao ser sincero confesso que mesmo tendo ouvido a obra em questão várias vezes nos últimos tempos, deu-se a casualidade de por essas núpcias não ter sentido qualquer tipo de nostalgia ou tristeza - o que não proporcionou essas lágrimas nocturnas, das horas a que faço questão de escutar as canções com atenção («longe da sociedade»).
"TURN" INICIA O PERCURSO, NUM compasso de ternura, aberto pelo barulho de umas sinistras carruagens. Entretanto, a vida de todo o EP (a confiança e actividade) começa apenas aos cinquenta segundos de "Run Run Run", o número dois. Depois de ter apalpado o terreno, os Jesus libertam-se de preconceitos e a variedade instrumental alia-se às palavras vindas da voz de Luís Nunes (terminando o período das teclas e da suavidade do baixo).
POSTO ISTO, «FOGO!, ESTES GAJOS são do melhor»: porque fomos expostos demais àquela semicerrada chama que teima em capturar-nos aos poucos.



Óptimo.


:Jesus, The Misunderstood - "Loving In July, Dying In August"/EP (Merzbau 2005)


1. "Turn"
2. "Run Run Run"
3. "Cosmonauts Go To Heaven"
4. "The Last Page In My Diary"

Os temas do EP.
Todo o EP aqui.

Rock Alternativo / Ambiental
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